QUANDO DEUS CAGOU
O ciclo circadiano.
O plano cartesiano.
Os pontos cardeais.
As rotinas rítmicas dos ponteiros.
O tempo aprisionado em círculos,
libertado no relógio biológico.
A regência das estações.
A inteligência humana,
fatal deslize,
inconseqüente brincadeira,
triste desastre
da criação,
composta numa aposta
entre dois deuses lunáticos,
valendo
uma nova forma de corpo celeste,
algo esférico,
que dá voltas,
e um novo tipo de bicho mundano,
algo racional,
que faz contas.
A matemática:
cálculo,
cômputo,
cósmica...
culpa nenhuma.
No acerto da aposta,
o deus que ganhou
ganhou o globo,
mas se recusou
a colocar nele o novo bicho
após ver o seu protótipo.
O deus que perdeu
perdeu o controle.
Pôs o novo bicho
no velho planeta
e jogou tudo pro ar,
que é o mesmo
que o mesmo lugar.
Ele é que saiu pela tangente
do plano cartesiano
do velho planeta plano.
O novo planeta
veio ao mundo
num feitio de orbe
e ego de astro,
diferente de tudo.
O mais belo, leve e racional:
povoado só por pedras.
Deu a idéia
de um novo jogo,
que foi a origem
do inusitado movimento
de girar o globo
com coisa na sua superfície,
chamada de “contraditório novo dentro”.
Transviaram a rotação:
os deuses viciados,
influenciados
por víboras que eles mesmo criavam,
criaram
uma víspora nova
com o virgem corpo celeste
e sua revolução.
Jogavam e perdiam
na mesma medida,
sem medi-la.
Não percebiam
que já tinham posto
de vísceras a umbigo
e apostado
até fortunas que não tinham
no bingo.
Logo,
o novo loto
reduziu as galáxias gastas
ao lodo
estelar.
Foi aí
que o grande Deus,
chefe de todos,
reassumiu o controle
—Ele tinha ido ao banheiro
e, nesse intervalo,
fizeram todo
esse pandemônio—
e fez do barro
um novo tudo.
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