MISTURA DE ÁGUAS DOCE E SALGADA
Se na nuvem
há água,
talvez nela
haja peixe.
Deixe-me
imaginar...
peixe-me mar.
E como o peixe
age nela?
Nada ou voa?
Uma nuvem,
uma lagoa.
E os peixes
se misturam, se transformam, se transmutam,
uns até se multiplicam,
com o meio:
tornam-se gotas
das próprias águas
em que estão imersos.
Os milagres
do desaparecimento dos peixes
que não existem
e do adensamento do mar
onde eles estão.
Uma única gota d’água
—tipo apóstolo, tipo apóstrofo—
no oceano
leva até três mil anos
para evaporar,
e nove dias na atmosfera
antes de se precipitar.
Um legítimo milagre
da ressureição,
tal qual o outro único desse:
o do Cristo em carne
que criava peixes.
Nada de reencarnação.
Por outro lado,
por muitos nados,
as reencarnações
do peixe,
que,
ao curso de milhares de águas,
torna-se terra,
com setenta por cento de umidade:
barro.
Sem precipitar nem evaporar,
nem sem fé nem com fé,
me afogo
me imaginando navegar
na água que há
escondida na nossa cara
e evidente na nossa carcaça.
Olho para trás
pra ver se enxergo o destino,
e acabo lambendo o leme.
A água
tem que ser reposta.
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