SANTO DA MADEIRA MACIÇA
Nada, além de partos, parecia acontecer naquele lugar. A terra fraca, tratada no fogo. O povo preguiçoso para o trabalho, mas disposto pra procriar.
Porém, colocavam a culpa de nada vingar naqueles arredores na julgada falta de fé do dono da maior porção de terra da redondeza. “Como pode um homem ter tanto chão e não ter um altar erguido nele?”
É certo que ele não era perfeito. Tinha uma fé falha, trôpega, e se enrijeceu com a caridade ao ver que, mesmo na maior precariedade, vestido de pobreza e despido pela miséria, o povo insistia em ter filho seguido de filho. Seis crianças, no mínimo, por mulher, sem condições de cuidar bem de mais de duas. E havia homens que faziam parte de mais de um casal. Por isso, aquele senhor não sentia dó nem pena nem compaixão da penúria de que era vizinho e testemunha. E tinha a consciência limpa do seu sentimento.
Um dia toda a comunidade se reuniu para remover a praga do chamado “homem desalmado”. Guiados por um sacerdote local e entoando hinos religiosos, chegaram à porteira da tal propriedade do tal homem maculado. Bateram palmas. Atenciosamente, ele foi atendê-los. Entre benzimento e expurgo, ouviu o pedido clamoroso para que ele desse à fazenda, batizada por ele de Casarão, um novo nome, inspirado em algum santo ou santa, assumindo a obrigação de enaltecê-lo ou enaltecê-la com um oratório no coração de sua terra, com a imagem do agora padroeiro ou padroeira.
Ele respondeu que esperaria a inspiração do santo ou santa vir e cumpriria a promessa terceirizada. Nesse dia, ele dormiu pensativo. Nem crente nem descrente, reflexivo.
Surpresa foi a sua ao acordar com uma idéia crucifixa. Mas, antes, fez como todo dia, dando a primeira prioridade à primeira refeição, agradecendo, como sempre, o pão pelo vigor e o vigor pelo pão. Só então foi pôr em prática a idéia, que, alimentada, tornou-se desejo: plantar uma árvore não no centro, mas no canto do terreno de que mais gostava, onde ela pudesse dar sombra para dentro e para fora de sua cerca.
Anos se passaram e a visão dinâmica de fé do homem se tornava mais forte, diferentemente da percepção que tinham do homem. Quem disse que enxergavam a árvore, embora usufruíssem da sombra dela o dia todo, menos ao meio-dia, quando a sombra desaparecia e iam lhe pedir comida na porta do casarão.
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